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7 de agosto de 2013

O Homem versus a Natureza?

São Paulo, uma das maiores cidades do mundo, vista de uma floresta próxima

Parece incrível que mais de 80 anos após as implicações da física quântica terem   quebrado o pensamento clássico, muitos ainda consideram o universo de objetos e pessoas como um sistema estático e linear, feito de pequenos blocos discretos que podem ser observados e, portanto, controlados de uma forma perfeitamente previsível . A falha básica deste velho paradigma está em imaginar que por compreender as coisas que podemos impor a ordem sobre elas. O menor tremor da terra desmonta essa ilusão.
Este tipo de antropocentrismo é uma das principais razões por nosso afastamento da natureza como ela realmente é – vibrante, comovente, viva e interativa, desintegrando-se e organizando-se continuamente. O divórcio entre a natureza interna do ser humano e a Natureza física, consideravelmente reforçado ao longo dos últimos 300 anos, quase conseguiu destruir o nosso planeta – quase, mas não completamente.
Uma tarde numa praia deserta. Um pôr do sol visto de uma montanha majestosa. Uma caminhada numa floresta virgem. Quem não sente uma identificação com a beleza dos elementos da natureza? A dicotomia do morador dos grandes centros urbanos, é que o fim de semana termina e as férias o arremessam de volta ao seu posto de trabalho de onde fica contemplando esta 'natureza' que só existe longe dos barulhos e cheiros dos centros urbanos. Muitos permanecem apenas no nível deste sonho tão bem representado pela letra da música de Elís Regina - "Eu quero uma casa no campo, Onde eu possa ficar no tamanho da paz..."  Pelo menos contam os dias até a próxima oportunidade surge para 'voltar' para a natureza.
A natureza é vista de forma romântica como uma utopia que contrasta com a distopia das manchas urbanas e seu materialismo frenético. A busca do "selvagem nobre" de Rousseau que vive harmoniosamente com a natureza e livre de egoísmo inspira o fundamentalista ambiental até hoje.
Do outro lado, a visão antropocêntrica e infelizmente vigente, é que o homem, sendo a peça principal da criação, tem o direito de explorar ad infinitum, os recursos da natureza, que lhe foram predestinados por algum decreto divino. Porém, não podemos negar que as outras espécies têm seu lugar. Há mais micróbios em um centímetro cúbico de terra que houve de seres humanos em todo a sua história!
Só recentemente, começamos a questionar estas duas posições extremas para encontrar um ponto de equilíbrio entre a sustentabilidade eo desenvolvimento, que até agora têm vivido em contradição uma com a outras. Empresários, políticos, cientistas, ONGs e cidadãos comuns "tentam" fazer uma ponte entre a preservação da beleza inerente do nosso planeta e o uso racional de seus recursos. Mas, como algun filósofo  moderno disse: "tentar, muitas vezes é uma forma preguiçosa de não fazer nada".
A principal dificuldade é que a dialética de ambos os extremos de nossas obrigações sobre a natureza está  equivocada. Não é o homem contra a Natureza ou que ele estava sempre brigando com ela e agora tem que se vestir de uma outra mentalidade para 'salvá-la'. Nossos corpos são feitos dos mesmos elementos que formam a Natureza. É o ar, a água e o alimento que nos fornecem cada molécula. As cidades são a Natureza transformada - as pedras que se tornam cimento, as árvores que se convertem em vigas, as antigas florestas que acabaram em petróleo e mais tarde em plástico. Portanto, a Natureza não é algo que começa onde as cidades terminam.
Vale a pena, neste momento, refletir sobre as implicações da física quântica na nossa visão do mundo. Há mais de 80 anos, ela abandou a divisão entre o observador (tipicamente um ser humano) e o observado (tipicamente a matéria inanimada). Os dois formam um todo. Um influencia o outro. Evidentemente, isso não se refere apenas à matéria, mas o que fazemos com ela e uns com os outros na construção de uma sociedade.
Enquanto continuamos a enxergar natureza como algo separada, um sujeito passivo como um paciente inconsciente numa mesa de operação, não vamos entender a profundidade da kinterrelação e da interdependência entre nós e nosso planeta que é um casamento de longa data. A dança entre o observador e o observado, implica que os problemas externos na natureza e na sociedade são manifestações da contaminação e da confusão que reinam dentro de nós. São inseparáveis.
E a propósito, quantos dias faltam até voltar para aquela praia?

Do livro, O Espírito do Líder, Integrare Editora, São Paulo, 2008
Por Ken O'Donnell